Arquivo do mês: janeiro 2009

Em obras…


Eu tenho blog desde Maio de 2003.

Comecei em outros endereços e com outros nomes: Impressões, Como Shirley Valentine, Cicatrizes da Mirada e, finalmente, o Língua de Mariposa.

Esse vingou como um representante de todos os outros e permanece há cinco anos , apesar das longas desaparecidas.
Agora estou prestes a mudar outra vez…

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Cesta de Gatos…

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Outubro. O mês da chegada do friozinho que eu amo. O mês das folhas amarelas e vermelhas do outono europeu, tão lindo, tão melancólico, tão música clássica no ar.
Eu podia ver os esquilos que moravam numa de minhas árvores descendo do ninho para buscar as nozes que eu havia deixado para eles num prato grande de barro, provocando a saudade antecipada que me perseguia desde dois meses antes. Ultimo café quentinho na caneca azul, ao som de Vivaldi, olhando por aquela enorme porta de vidro que dava para o jardim, já com cara de triste e sozinho.
Eu sabia que o próximo “dono” não iria morar ali e uma casa sem gente perde em vida. Um jardim, então, sofre demais. Por isso eu havia presenteado aos vizinhos e amigos todas as minhas plantas. A “selva amazônica”, como eles chamavam, já estava distribuída e ele já parecia meio nu, meio abandonado.
Bem que eu queria poder levar a casa interinha conosco!
De volta ao futuro me dei conta do caminhão na porta dos fundos, devidamente autorizado para transportar tudo o que eu havia previamente organizado por setores da casa: quarto azul, quarto laranja, quarto de hóspedes, “habitación de matrimonio”, livros, livros e livros… cozinha, 3 banheiros, escritório, salão, mais livros e livros e livros…que casa tão imensa, meu Deus!
Pois sim… Consegui organizá-la muito bem – enquanto todas as bruxas dormiam – durante as semanas que antecederam a data. Porcarias devidamente jogadas no lixo, coisas desnecessárias para dentro dos baús de “guardados-desnecesariamente-guardados”, coisas essenciais e importantes encaixotadas, com etiquetas e tudo.
Isso fui fazendo dia após dia com uma dor nas costas que não me abandonava e noite após noite de insônia em que, de olhos fechados mas totalmente desperta, eu arrumava e desarrumava tudo outra vez, tinha ideias fantásticas do que fazer no dia seguinte, que logo seriam esquecidas. E uma impaciência que já estava transbordando por todas as saídas do meu corpo.
Então chegou o bendito dia. Três criaturas absolutamente desconhecidas mexendo em toda parte, entrando em todos os cômodos, abrindo e esvaziando todas as minhas gavetas, metendo cada objeto em imensas caixas com letras e números. H1, H2, H3… ESCR, COZ, BAN, ENTR. Cada caixa dizendo de onde havia sido retirado seu conteúdo.
Fácil assim. Depois era só desembalar tudo e guardar…
Onde?
A cesta de gato para onde seguia aquele mundaréu de caixas imensas tinha dois quartos pequenos, um banheiro, uma prometida cozinha e um pequeno hall. Ah! e uma sala que não sei por que meu pirata chama de “salón“. Acho que seu costume de viver quase toda a vida em camarotes de barcos e dormir por nove anos em camas de submarinos, essa pequena sala possa mesmo ser chamada assim. Tá. Eu deixo. Mas que é uma salinha de nada, é!

Tá bom. Tá bom. Isso eu já sabia. Estávamos levando o essencial: perto de dois mil livros, oitocentos CDs, poucas roupas (só o que passou pelo crivo), objetos para cozinhar ( não tinha quase nada ) e comida, alguns móveis comprados de ultima hora: 15 estantes, 1 sofá, 2 poltronas, 1 cama, 1 guarda roupa, 1 sofá-cama, 3 gaveteiros e 3 mesas de trabalho. Coisas do tipo “monte você mesmo e demonstre a todos o quanto você precisa de nós.” Já reconhecendo nossa ignorância pagamos para que nos montassem os sofás, a cama e o armário do quarto, um dia antes da mudança. O resto ficava para nós. A conta nos convenceu que valia a pena tentar!
Ótimo! Para quem vivia numa casa completamente mobiliada mas não tinha nada, já podíamos contar com um bom começo. Isso mesmo. Como somos organizados e competentes, heim? Assim antes da mudança chegar já teríamos onde dormir e onde guardar o básico. E eu saberia onde estava tudinho, tudinho…
Pois sim.
Eles não são. Nem organizados nem competentes. O guarda-roupa chegou com meio metro a mais do que o tamanho da parede do quarto e teve que voltar. Tivemos que convencer a loja que o erro foi deles, porque a priori eles nunca erram e o culpado é você. Mas não foi. E eles tiverem que vir no dia seguinte. O dia da mudança.
Os sofás também viriam naquela tarde mas, que fatalidade! o pneu furou e eles viriam também no dia seguinte. O dia da mudança.
Foram elas? As bruxas de plantão acordaram, as danadas!?
Então … No dia 17, o caminhão estava parado diante do prédio de uma rua bastante movimentada e não podia fazer nada porque a casa era um verdeiro balaio de gatos. Estava invadida por outros. Gente na sala, no quarto, na cozinha…. Peraí! que cozinha? Aquele buraco negro seria uma cozinha num dia muito distante! Eles não tinham prometido tudo pronto dia 15? Depois de mais de um mês de atraso, eles juraram à dona do apartamento que a cozinha estaria prontíssima no dia 15 de outubro. O que era aquilo? Como assim pronta?
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Quando estará terminada, perguntei com cara de choro? “Na segunda feira, senhora. Isso se faz neste final de semana.” Eu juro que quis acreditar. Mas estava difícil, viu.
Dizem que as pessoas que trabalham na construção tem uma forma distinta de funcionar. Tempo é algo que não existe. E o cliente é aquele ser incômodo que está aí para fazer perguntas impossíveis de responder. É absolutamente necessário enganá-lo! Quem mandou perguntar besteira!
Entrei na sala e vi dois sujeitos que estava montando um sofá que não era o que eu havia comprado! Trouxeram um outro sofá!
Como assim?
Esses também são seres especiais. Eles agem como se estivessem ali por acaso. Não representam a empresa onde trabalham. Aliás eles nem conhecem ninguém naquela empresa, iam passando pela rua e lhe mandaram entregar esse sofá na casa daqueles desconhecidos, que por acaso estavam pagando pelo serviço. É assim mesmo?
É. Pelo menos é o que parece ser. Eles disseram que entrássemos em contato com a loja e se foram. E por cima deixaram um super sofá branco que ocupava mais da metade del salón, que não era meu e que ia se encher de poeira e cimento. Pânico na garganta. Onde estavam aquelas lágrimas que pareciam prestes a sair na porta do inferno negro que chamavam de cozinha? Dei a volta e fui para o quarto onde montavam o guarda roupa, finalmente com a medida certa. Um pó de madeira cortada cobria toda o colchão da cama onde pensávamos que íamos poder dormir. Em estado de choque eu não podia nem chorar de tao cansada. O pirata estava com uma cara de “vou-fugir-no-próximo-barco-que-passe-na-porta”. Porque só faltava passar um barco pela rua, em plena meseta castelhana. Juro que eu iria também. Com gosto!
Telefonei para um amigo que vive em Madrid e pedi guarida. Por umas duas noites. Queria ser otimista, juro. Até que soube que a mudança dormiria no caminhão, diante da porta do prédio. Até amanha. Heim? Heim?
Eu sou brasileira. Tenho experiências traumáticas, será que ninguém entende? Minha mudança ia dormir na rua? Como assim? E eu? Como dormir sem sonhar que no dia seguinte não haveria nem o caminhão para contar a história do saque! Uffffff!
Calma. Calma. Não havia outra saída, nem outro lugar. Ia ficar ali mesmo, bem no meio da rua.
Amanhã a gente volta“, disseram os três desconhecidos
Tá.
Então foi o que decidimos.
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Voltamos no dia seguinte e respirei fundo. Estava tudo tranquilamente onde deixamos! E ao abrir as portas, não faltava absolutamente nada!
Yes!
Decidimos amontoar as caixas no hall e em um dos quartos. Não cabiam, claro. Então elas começaram a se espalhar pela sala e pelo meu quarto também. As montanhas de caixas criavam um ambiente perfeito para um pesadelo: morrer embaixo de uma delas.
A dor nas costas crescia, crescia.
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Todos os dias eu voltava e tentava abrir caixas, organizar os armários, mas organizar era uma palavra que simplesmente não entrava naquele lugar. As coisas saíam das caixas mas elas apenas mudavam de um lugar para outro, formando outras pilhas espalhadas por toda a casa, sem qualquer sentido comum. E meu calmante natureba só chegava do trabalho no final da tarde! Ele vinha cansado mas disposto a montar as estantes onde pôr os milhares de livros e discos. Era preciso esvaziar espaços senão eu ia morrer de claustrofobia!
O buraco negro chamado cozinha foi se vestindo de madeira e cerâmica, len-ta-men-te. M-u-i-t-o       l-e-n-t-a-m-e-n-t-e !
Dormimos na casa do amigo até o dia 22. Seis dias depois da mudança. Que mudança? Eu não estava nem em uma casa nem em outra. Estava no limbo!
Neste dia havia uma promessa formal do pseudo-profissional responsável (? ) pela obra de montar a caldeira de água quente, fundamental para a saúde mental e física de quem tem que tomar banho nesta terra onde a água é gelaaaada em qualquer época do ano. Ele também teria que montar as cortinas, retiradas antes da pintura do apartamento. Tá.
A criatura chegou com três horas de atraso, impedindo a empresa contratada para a limpeza da obra de realizar seu trabalho, seu ajudante montou a caldeira e já iam saindo quando perguntei pelos móveis e eletrodomésticos. Não pergunte! Disseram-me seus olhos. Lá vou eu ter que enganá-la outra vez! Olhando para a janela como se eu não estivesse ali ele resmungou que estava pensando em telefonar-me no dia seguinte para avisar-me quando viria a empresa que montaria a cozinha. Fogão, geladeira, pia… TUDO! Talvez na segunda feira seguinte. Heim?!
Perguntei ( De novo! Que ousada!) pelas cortinas. Cortinas? Ele me olhou como se eu fosse um ET. Disse que não sabia delas, que guardou-as nuns sacos negros de lixo e que deixou-as – com muito cuidado – na entrada, bem ao lado do lixo da obra. Que inteligente, não? Em bolsas de lixo, ao lado do lixo. Desde quando isso se chamava “guardar“?
Isto é, o sujeito “desapareceu” as minhas caríssimas cortinas… todas.
E para piorar sugeriu que quem havia jogado fora os sacos de lixo tinha sido eu e meus ajudantes da mudança. Heim?
Ataquei. Cresci uns dez centímetros. Avancei para o sujeitinho de rabo-de-cavalo e cara de rato e ele recuou até a parede apavorado.
Não, não foi físico o meu ataque. Foi psíquico. Avancei dois passos em sua direção com uma cara de louca mais ou menos igual a de Mme Mim, descabelada e com os olhos injetados de raiva. Aposto que ele está em pânico até agora. Ho ho ho!


Soltando fogo pelo olhar e cuspindo cada palavra como uma serpente malvada eu disse que ele não me tratasse como uma das suas clientes idiotas, que eu exigia respeito, que ele era absolutamente responsável por tudo o que dissesse respeito à obra e seus resultados, que parasse de mentir descaradamente e responsabilizar-me por sua incompetência. Que ele não estava atrasado dois ou três dias e sim quarenta e cinco e que eu não iria admitir que me tratasse como uma imbecil. Queria minha casa JÁ. Habitável. Pronta. E cada cortina em seu lugar ou outras exatamente iguais. E que a partir de agora eu iria acampar bem diante da porta da cozinha para acompanhar cada passo seu dentro da MINHA casa, que lhe telefonaria a cada dez minutos para que me dissesse a verdade e respondesse pelo trabalho que lhe haviam contratado. Tudo isso sem respirar. Sibilando entre os dentes. Assustador, nãao???
Todos os outros cinco homens ( quatro da limpeza que não se fez completa por sua culpa ) que estavam ali naquele momento pararam o que faziam para escutar-me. Nunca falei um Espanhol bem falado e claro como naquela tarde.
Pronto. Depois disso fiquei doente. A dor nas costas, que me acompanhava há quase um mês, aumentou desesperadamente porque toda a raiva ficou presa naquela parte do meu corpo. Por quatro dias não pude mover-me, nem arrumar caixas, nem tomar banho sozinha, nem nadica de nada. Verdadeiramente acampei na porta da cozinha, deitada numa das maravilhosas poltronas brancas e cobertas de plástico cheio de pó de cimento. A loja só veio trocá-la mais de uma semana depois da entrega equivocada. F*-se!
Da quarta até o sábado eu só chorava todas as lágrimas que estavam presas no nó da garganta. E fabriquei muitas mais. Eu era uma enorme lágrima! Não dormia quase nada. Cansei muito.
Só Domingo pude sair pelas ruas de Madrid e aproveitar uma bela manhã de sol!
A cozinha foi vestindo-se e agora há um sujeito competente lá, montando tudo, enquanto escrevo esse texto procurando não sentir toda a raiva outra vez, por causa da dor… vai que ela resolve voltar.
Já posso respirar e tomar banho sozinha. Já posso andar sem ter vontade de chorar a cada movimento. Não vou arriscar.
Ele também não arrisca. Desde aquele ataque verbal o homenzinho cara de rato nunca mais voltou aqui. Manda tudo por controle remoto: um pedreiro da Romênia que mal fala Espanhol e que me olha com pena e cara de carinho. Melhor. Prefiro não ver o rato.
Só quero minhas cortinas nas janelas. Já.
não existe aqui. Preciso esquecer a palavra. Isso ele ainda não solucionou. Mas vai solucionar. Ah, vai.
Preciso esquecê-lo também para recomeçar minha vida.
Nada mal heim, para uma mulher que pensava que tinha a vida resolvida na entrada do século XXI e que nos primeiros dois anos do novo milênio abandona seu país atrás de uns olhos-de-mar-azul pelos quais está absolutamente em surto amoroso. E depois de viver no mato, rodeada de esquilos e raposas, os melhores anos de felicidade de toda a sua vida e de casar com o dono do sorriso tarja preta mais belo do planeta… agora vai viver alguns anos ” en los Madriles”.
Claro que a história não podia ser simples e comum, se tratando de mim. Faz uma semana que comemos sandwiches prontos com coca-cola em pratos e copos de plástico, dormimos numa deliciosa cama nova rodeados de montanhas de caixotes, temos uma imensa lista de “necessidades urgentes” , não sabemos onde está nossa roupa, não podemos comemorar a nova vida pois estou tomando umas bombas de anti inflamatórios e… ainda não parece que vivo em Madrid.
A mudança estava programada para o dia 05 de setembro. Adiada para o dia 10, depois para o dia 20 e finalmente para o mês seguinte, em 15 de outubro. Ainda dei dois dias de lambuja, por se acaso…
Estamos em 28 de outubro e nós ainda não consideramos a mudança feita.
Todo mundo já sabe que não pode viajar comigo porque as coisas nos aeroportos nunca funcionam como deveriam. Agora já sabem que não podem fazer mudanças também.
Ah!… e tenho passagens compradas para Lisboa no próximo dia 5. Ainda não sei nem o que vou pôr na maleta e … por falar nisso, onde está meu passaporte?
Ai meu Deus…
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Pois é. O texto estava escrito, mas não pude publicá-lo. Não tinha Internet em casa, nem tinha casa, nem tinha espírito, nem tinha vontade.
Fui à Lisboa e Sintra pela primeira vez e fiquei encantada. Foi como encontrar um oásis dentro do deserto. Dormir num quarto de hotel limpo com cortinas e privacidade, sair para passear sem preocupar-me com nada mais do que ser feliz por quatro dias tranquilos e belos.
Foi fantástico fazer a viagem e nos ajudou a relaxar para encarar a tarefa de “fabricar” uma casinha gostosa na volta.
Demorou mais do que esperávamos, mas conseguimos. Já podemos cozinhar, ver televisão e escutar música. Já tenho minha mesa de trabalho montada num escritório inventado bem no “ex-hall” do apartamento, os abrigos em seu armário, as roupas no guarda roupa e uma caneca de chá verde, quentinho, bem na minha frente.

Entre Outubro e Janeiro minha filha veio viver em nosso caos ajudando a reforçá-lo*, com mais caixas, roupas e livros… e livros, videos e CDs. Recebi hóspedes ( juro que não sei como, mas mesmo assim foi bárbaro! ) viajei, voltei, viajei outra vez, comemorei O Natal em Tarifa e o Ano Novo na Cesta, com uma ceia deliciosa.

Agora já posso dizer:

O passaporte está desaparecido outra vez, mas esses detalhes precisam de mais tempo. As coisas também tem alma e escolhem seus lugares dentro da nova morada.
Fazem quatro dias que tenho um prazer novo: a rotina.
Que delícia!
* Ela, a filha, bem que tentou trazer os ramsters, a tartaruga e os peixes… mas eu só deixei vir a gata. Zefini. Sem negociações!

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Saindo da toca…

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A foto mostra meu café favorito, Café Recoletos, no centro de Madrid, adornado como uma noiva. A fantástica nevada foi um presente da natureza neste nove de Janeiro e eu estava lá… caminhando sob a neve e tomando um café quentinho por trás dessas maravilhosas vidraças bem no meio do Paseo Recoletos. Bárbaro!
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A todos que vieram aqui e deixaram seus recados, obrigada. Aos que vieram e não deixaram nada eu também agradeço porque esse fluxo, mesmo durante um abandono tão grande, me incita a voltar.
Queridos, de vez em quando o blog sai de férias, ou inverna, dorme. Mas não morre. Desta vez ele passou dos limites e quase morreu. Graças a voces e suas mensagens carinhosas ele sobreviveu. Obrigada pela paciência.
Aos novos vistantes quero registrar também meu muito obrigada. Já os visitarei… me aguardem.
Beijos de Feliz Ano Novo!
Voltei.

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